sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Pois é, rolha natural ou screw-cap?



Meu amigo Miguel Ângelo Vicente Almeida, enólogo-winemaker português que hoje trabalha no Miolo Wine Group, recebeu um pedido de informações sobre o uso da rolha tradicional ou da moderna screw-cap, a cápsula metália para fechar garrafas de vinhos. Eis sua resposta:
“Sabemos que perante um vinho fechado com rolha natural, o consumidor tem uma grande expectativa em comparação com os outros tipos de fechamento. Mas o tempo é o grande modelador das nossas convicções, a história da rolha de cortiça natural com o vinho tem cerca de 400 anos e a história do screw-cap com o vinho tem cerca de 60 anos. Como disse a Baronesa Philippine de Rothschild: “Produzir vinho é relativamente simples, só os primeiros duzentos anos são difíceis.”.
Para nós do Grupo Miolo, a opção de vedar um vinho com rolha natural ou screw-cap é uma decisão técnica.
Hoje, para proceder o fechamento de uma garrafa de vinho, o enólogo possui várias soluções: rolha de cortiça natural, rolha sintética, rolha de vidro (vino-lok) e screw-cap de alumínio. Contudo, as duas principais soluções são a rolha de cortiça natural e o screw-cap de alumínio.
Se o objetivo for entregar ao consumidor um vinho próximo daquilo que o enólogo obteve na fermentação e/ou estágio de amadurecimento, o vedante mais indicado para este efeito é o screw-cap, que proporciona um fechamento hermético, bloqueando a evolução oxidativa do vinho. Por outro lado, se o objetivo for permitir evolução, a decisão será vedá-lo com uma rolha de cortiça natural que permite uma mudança positiva no tempo. O screw-cap é uma redoma, a rolha de cortiça natural representa transformação.
A cortiça é composta por células de suberina com a forma de um minúsculo prisma pentagonai ou hexagonal, um ácido gordo complexo, e preenchida com um gás semelhante ao ar, que ocupa cerca de 90% do seu volume. Portanto, a cortiça contém oxigênio que migra para o vinho, ajudando este a se polimerizar, a se arredondar, mudando irremediavelmente a sua vida e as suas histórias.
Estudos recentes demonstram que os diferentes tipos de vedantes diferem na sua permeabilidade ao oxigênio atmosférico. Os sintéticos são os que apresentam maiores taxas de entrada de ar, oxidação prematura, seguidos das rolhas de cortiça natural, evolução equilibrada, enquanto screw-cap é o que permite menores taxas de entrada de oxigênio, evolução lenta.
Num vedante sintético o ar migra, através de si, de fora da garrafa para dentro do vinho. Numa rolha de cortiça natural o oxigênio migra do interior da rolha para o vinho. Num screw-cap sarantin, o do disco interno prateado, não existe migração de oxigênio (screw-cap saranex é o do disco interno branco).
Como adendos informativos sobre rolha de cortiça e tampa rosca:
1.            A rolha de cortiça é um elemento 100% natural, 100% biodegradável, proveniente diretamente da casca de uma árvore da família dos carvalhos, o sobreiro. A sua retirada é feita a cada nove anos, sem que nenhuma árvore seja cortada durante este processo. A cortiça dá origem a uma infinidade de produtos, e o principal é a rolha. Cada sobreiro demora 25 anos até poder ser descortiçado pela primeira vez e só, a partir do terceiro descortiçamento (aos 43 anos), a cortiça tem a qualidade exigida para a produção de rolhas. O sobreiro é a única árvore cuja casca se autorregenera, adquirindo uma textura mais lisa após cada extração. Pode ser descortiçado cerca de 17 vezes ao longo de uma longevidade que é, em média, de 2 00 anos. E não está em extinção, é a árvore símbolo de Portugal. Eu me curvo em deferência perante este elemento natural.
2.            O primeiro screw-cap para vinho foi criado pela empresa Stelvin, em meados da década de 60, sob o comando do diretor de produção da vinícola australiana Yalumba, em parceria com uma empresa francesa. O screw-cap ganhou espaço no mundo dos vinhos à custa da imprudência dos corticeiros portugueses, os quais no final da década de 90 (boom mundial da produção de vinhos) inundaram o mercado com cortiça de má qualidade, cortiça com problemas de tricloroanisóis, vulgo TCA, composto químico com cheiro a mofo, cartão úmido. No inicio do novo milénio, os britânicos firmaram a sobrevivência do screw-cap no fechamento de garrafas de vinho. No Reino Unido, a aceitação dos vinhos vedados com screw-cap foi de 41% em 2003 e 85% em 2011.
O Grupo Miolo utiliza como vedantes dos seus vinhos:
1.            O screw-cap para vinhos básicos de características jovens (Almadén, Miolo Seleção e Miolo Gamay) até vinhos de qualidade premium, a grande novidade da vindima 2015 (Miolo Reserva Chardonnay, Pinot Grigio, Sauvignon Blanc e Pinot Noir). Podem reparar que o Miolo Reserva Sauvignon Blanc 2015 está todo ele fechado com um screw-cap sarantin. Este tipo de screw-cap apresenta os menores valores de oxigénio total aquando do engarrafamento, de 0,0001 a 0,0007 ml O2/dia;
 2.           A rolha de cortiça natural para vinhos premium (Miolo Reserva Cabernet Sauvignon, Merlot, Tempranillo e Tannat) até vinhos de qualidade ícone, vinhos altamente estruturados (Miolo Cuvée Giuseppe, Quinta do Seival Cabernet Sauvignon, Quinta do Seival Castas Portu guesas, Testardi Syrah, Vinhas Velhas Tannat, Miolo Merlot Terroir, Miolo Lote 43 e o Sesmarias).

Os produtores de vinho decidem o tipo de vedação com base em experiências passadas, na filosofia atual, em questões técnicas, custos e as exigências do mercado. Em suma a rolha é vinha e o screw-cap é homem. Os quatro são complementares.

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